Bem, a
Índia não é dos melhores países pra viver sendo uma mulher. O Brasil também não
é bom, mas acho que lá consegue ser pior. O machismo é natural e arraigado na
cultura do país de forma preocupante. O entretenimento mostra isso. Bollywood é
machista.
Filmes protagonizados por mulheres (nos quais elas conduzem
a ação) são poucos, muito poucos em comparação aos protagonizados por homens.
Mesmo atrizes famosíssimas como Aishwarya Rai, Kajol, Madhuri Dixit, Rani
Mukerji, não são as protagonistas da maioria de seus filmes. Sempre tem aquela
figura masculina predominante. Quando um filme está para ser lançado, ouvimos
falar “dos jodis”, quem será par de quem. Mas na realidade, o filme é
protagonizado mesmo pelo ator, o homem. E não são apenas os filmes românticos
que seguem essa linha, pelo contrário, em alguns deles as atrizes ainda tem
mais falas, ao contrário de determinados filmes de ação, por exemplo.
Vamos pegar o nosso ultra-mega-hyper casal favorito de todos
os tempos: Shahrukh Khan e Kajol. Eles fizeram seis filmes juntos, sendo SRK o
protagonista de todos (acho que apenas no começo da carreira ele fez
coadjuvantes). Em filmes como DDLJ, KKHH, K3G e MNIK, Kajol teve muitas cenas,
objetivos e participação efetiva nos filmes. De todos, DDLJ é o que ela mais
tem tempo na tela, dividindo mesmo o filme com SRK (tem uma canção só sua e
participa das outras, tem diálogos com outras mulheres e personalidade bem
definida). Em KKHH e K3G, temos outras personagens femininas coadjuvantes,
porém com destaque. Em MNIK, o protagonismo é maior da parte de SRK, mas mesmo
assim ela é fundamental à trama, construindo uma Mandhira batalhadora, talvez a
mais admirável de todas as seis heroínas. Em Baazigar, ela faz uma heroína
marcante, num filme todo de SRK. E Karan Arjun? É o pior papel de Kajol em
todos os seis filmes, não me admira ser um de ação. Ao contrário do que algumas
pessoas pensam, Kajol não fez apenas mocinhas românticas, ela fez heroínas
fortes, como a Naina de Dushman. Mas mesmo nesse filme (que é de 1998), no qual
Kajol é obviamente e claramente a protagonista, o nome de Sanjay Dutt vem antes
do dela. Pois é...

Kajol, hoje e sempre, minha atriz favorita. E eterna diva do blog.
Se não tá legal nos filmes de amor, tá ainda pior nos filmes
de ação. Hoje, o gênero masala (aquele da câmera lenta e ação quase de desenho
animado), é a galinha dos ovos de ouro de bollywood. As cifras das bilheterias
enchem os olhos dos produtores. São realmente filmes divertidos, mas nas
questões de gênero, são uma vergonha. Assisti alguns desses filmes, como
Dabangg 1 e 2, Singham, Wanted e o tão falado Rowdy Rathore. E eles tinham duas
coisas em comum: heróis policiais de bigode e mulheres em papéis absolutamente
inúteis. Em Dabangg, Rajjo, interpretada por Sonakshi Sinha, mal abre a boca
nos dois filmes da série. Ela é linda, me lembra a Rekha, mas é uma plantinha.
A sensação que tive era que estando ali ou não, o filme seguiria da mesma
forma, mas era necessário ter uma mulher bonita para inspirar algumas canções.
Pior que Rajjo, só a menina de Singham. Tive que ir ao IMDB pegar o nome dela
(Kavya, pra vocês que provavelmente também não lembram), pois era tão, mas tão
descartável, que nem lembro direito da carinha da atriz. Ela cantou duas
músicas que em nada, nada mesmo acrescentaram na trama. Já Wanted e Rowdy
Rathore, dois filmes muito parecidos, diga-se de passagem, sofrem do mesmo mal.
Rowdy Rathore foi falado e recomendado para mim, mas me decepcionei um pouco. Além
de ser mais do mesmo, traz novamente Sonakshi Sinha no mesmíssimo papel
descartável de Dabangg. Até a interpretação dela era a mesma. O__O

Madhuri Dixit, Preity Zinta e Aishwarya Rai: atrizes que amo.
Os filmes masala me lembram algumas coisas que via nos
filmes americanos dos anos 80, só que ao invés do Stallone sair atirando, é o
Salman que sai distribuindo chutes e socos. Mas a ideia do “exército de um
homem só” é a mesma. E o papel das mulheres também. Nos filmes dos anos 80, as
atrizes volta e meia pagavam um sutiã, uma calcinha, quando já não mostravam os
peitos. Gritavam loucamente para serem salvas e nada mais. As personagens
femininas dos masalas que assisti (e aceito recomendações de masalas que fujam
dessas situações, pois vocês sabem que sei nada de bollywood), não ficam nuas, mas pouco fazem também. São lindas e nada
mais. Vamos deixar de ver esses filmes por causa disso? Não, pois assim como “Comando”
e “Rambo II” são divertidos de assistir, mas não podemos fechar os olhos e não
ser críticos. Não consigo conceber que me venham reclamar de Simran e sua
posição "pouco independente" e coloquem filmes como Singham e Rowdy Rathore no
pedestal da obra prima, quando a heroína desses tipos de filme é tão inútil e
submissa que chega a ser constrangedor.

Priyanka Chopra, Anushka Sharma e Deepika Padukone: atrizes que amo
Os filmes americanos ainda não são um ideal de igualdade de
gêneros, mas pelo menos temos algumas heroínas fortes nas telas em filmes de
ação, como Ripley, Trinity e algumas da Angelina Jolie. Tivemos uma Mulher-Gato
e tanto no último filme do Batman e até as Bond Girls, que antes se limitavam a
ser lindas e loucas pelo 007, já quebram tudo e tem uma participação mais
significativa. O cinema indiano tem filmes protagonizados por mulheres, como o
ótimo Kahaani, Aaja Nachle, Fashion, We are Family, No One Kills Jessica, Dirty
Picture, Heroine, só pra citar alguns. Mas em comparativo, esses filmes perdem
de longe para a quantidade de filmes protagonizados por homens. E os filmes de
ação, que podem não agradar algumas pessoas, são os mais populares, seja na
Índia ou nos Estados Unidos. Por isso é tão importante, a meu ver, essa
discussão.
Eu amo bollywood, seus filmes, seus atores, suas músicas e a
forma como contam suas histórias. Mas antes de ser fã, sou mulher, sou
brasileira e sim, sou uma pessoa que pensa e raciocina. Ser fã é amar, mas
também criticar quando preciso for. No dia internacional da mulher nós
aproveitamos para externar o que devemos pensar todos os dias: o que nós, como
sociedade, estamos fazendo para mudar e melhorar as condições de vida das
mulheres no mundo? Criticar um filme de ação fará diferença na vida das meninas
na Índia? Acho que pode fazer sim. Porque se você, diante de uma dificuldade se
vê como a Ripley, armada com um lança-chamas e enfrentando um alien, com
certeza a Sigourney Weaver e o James Cameron fizeram diferença para o
mundo.